
Apesar de Lisboa ser uma capital de dimensão relativamente reduzida, este roteiro de um dia em Lisboa não pretende ser um top de atrações turísticas nem responder à eterna questão sobre “o que fazer em Lisboa”. É, ao invés, uma visão pessoal sobre o que poderá ser um dia bem passado na cidade, especialmente para quem pretende visitar Lisboa pela primeira vez ou deixar-se guiar na descoberta da cidade. É por isso mesmo uma viagem feita de escolhas, porque 24 horas é pouco tempo para conhecer Lisboa.
Manhã
Permite-te acordar naturalmente. Acredita, vais agradecer-me mais tarde.
Começa entre o Bairro Alto e o Príncipe Real, debruçado no miradouro de São Pedro de Alcântara. Aprecia a vista do rio, do castelo e dos telhados da colina em frente e sente o sol da manhã na cara.
Diz bom dia ao velhote que passeia o seu cão. Se ainda não comeste, toma o pequeno-almoço no quiosque. Se comeste, bebe um café.

Desce a Calçada da Glória a pé, ou no elevador, e aprecia os painéis com graffiti à tua esquerda. Nos Restauradores, apanha o metro e sai no Marquês de Pombal. Sobe o Parque Eduardo VII. Repara na fonte que está no topo. É uma homenagem ao 25 de Abril, feita por um escultor Português famoso (João Cutileiro). Sim, parece um pénis.
Atravessa a rua e entra no Jardim Amália Rodrigues. Circunda-o até avistares uma ponte de madeira. OCorredor Verde de Monsanto começa aqui e leva-te até ao Parque Florestal de Monsanto, os “pulmões” da cidade de Lisboa.
Caminha dois quilómetros. Rebola nos relvados, admira as manobras dos skateboarders, aprecia a arte urbana e repara nas pequenas hortas. Amaldiçoa os hotéis horríveis à tua direita e maravilha-te com a imponência do Aqueduto das Águas Livres à tua esquerda (que podes visitar).

Não desistas quando chegares à ponte que parece uma autoestrada – estás no caminho certo. Atravessa-a e passa por baixo do viaduto, seguindo o caminho marcado. A mancha de verde que é Monsanto vai aparecer à tua frente. Relaxa um pouco e regressa seguindo o mesmo caminho, de volta ao metro. Ou então passa o resto do dia em Monsanto… não faltam coisas para fazer.
Hora de Almoço
No metro, sai na Baixa/Chiado para a Rua do Crucifixo. O Oito Dezoito está na esquina com a Rua de São Nicolau. Almoça dois pratos de cozinha tradicional de autor por 10€. Vai-te apetecer uma sesta, mas sai para beber uma bica em vez disso.
Na Pérola do Rossio fazem a sua própria mistura de café e moem-na na hora. Por cinquenta cêntimos pode beber-se um shot de cafeína bem aromático. Compra um pacote de uma das misturas da casa, moída a pedido para o tipo de máquina que tenhas.
Passa pelos turistas avermelhados amontoados na esplanada da Casa Suíça. Parece que estão a fazer fotossíntese. Vira na segunda à direita e não bebas a ginginha d’A Ginginha – vais encontrar melhor mais à frente. Espreita o interior da Igreja de São Domingos: repara nas cores das colunas de mármore e no altar preto, queimado. É lindo, e mórbido. Mas eu acho todas as Igrejas um pouco mórbidas.

Continua pela rua à tua esquerda até chegares ao Martim Moniz. Vê se há alguma exposição na praça e pensa em voltar e almoçar num dos muitos quiosques, noutra altura. Não cedas à vontade de te estenderes nas espreguiçadeiras em frente à fonte, atravessa a estrada e vira à esquerda depois da Igreja da Sra. da Saúde. Estás no bairro da Mouraria.
Vira à direita quando vires a estátua da guitarra Portuguesa e segue em frente até veres, do lado direito, uma porta com o letreiro “Amigos da Severa”. Viste, eu disse que havia um sitio melhor para a ginginha. Conversa com o Sr. António e tenta perceber se ele estará bêbado ou não. Não vais chegar a nenhuma conclusão. Felicita-o pelos 35 anos que leva a trabalhar aqui, bebe mais uma, ou duas, e segue caminho, ligeiramente “tocado”.
Tarde
No cimo da rua está o Largo da Severa. Reza a lenda que é o sítio onde nasceu a primeira cantora de Fado famosa. A sua casa é agora um restaurante e casa de fado.
Deambula pelo bairro até chegares à Rua de São Lourenço (dica: vai virando sempre à direita). Sim, é confuso e provavelmente vais-te perder, mas isso faz parte do passeio. Inspeciona os edifícios com azulejos verdes, azuis e vermelhos, acena aos velhotes com boinas, à freira que passa, às mulheres comsaris. Descansa num dos bancos das pequenas praças que vão aparecendo.

No fim da Rua de São Lourenço chegas ao Largo dos Trigueiros. Há uma fonte no meio e grinaldas coloridas. A árvore poderá estar decorada de alguma maneira. Poderás encontrar senhoras idosas a fazertricot e a conversar, sentadas no banco, ou homens negros a ouvir musica Cabo-verdiana, ou jovens a fumar uma ganza, ou então ter o largo só para ti. As fotografias nas paredes das redondezas fazem parte de um projeto da Camilla Watson. Representam a vida e as pessoas do bairro. Queres saber mais? O estúdio é já aqui.
Continua em frente. Vais passar por mais ruas estreitas, prédios antigos e chegar ao Largo de São Cristóvão, com a Igreja homónima. Se te apetecer, desvia-te para as ruas secundárias para sentir a vida do bairro. Cumprimenta as senhoras que estão à janela e espreita as drogarias antigas que ainda se encontram por aqui.
Subindo pela Calçada do Marquês de Tancos já estás na encosta do castelo. Provavelmente já o tinhas percebido, por causa da inclinação da rua. Descansa um pouco na esplanada do Chapitô, a beber uma imperial. Este conjunto de edifícios brancos, vermelhos e amarelos rodeia um pátio lindíssimo com mesas e cadeiras diferentes, um pequeno jardim de ervas aromáticas, uma tenda e uma das melhores vistas sobre Lisboa e o rio Tejo. Tudo isto pertence a um projeto que inclui, no mesmo espaço, uma escola de circo e artes performativas, uma casa para jovens desfavorecidos que frequentem a escola, palcos para ensaios e espetáculos, um restaurante e um bar.

Continuando pela mesma rua, um pouco mais acima está um painel de azulejos brancos e azuis a representar Santo António, um dos santos padroeiros de Lisboa. Eu acho-o piroso, mas muita gente parece apreciá-lo. Para a esquerda, no cimo da colina, está a entrada para o Castelo de São Jorge, mas vais seguir em frente. Ouve-se Fado no ar.
Quando chegares ao miradouro de Santa Luzia vais ter de decidir se te queres manter por aqui e ir explorar Alfama, que está aos teus pés, ou se já tiveste a tua dose de bairros históricos. Não consegues decidir? Ok, faz as duas coisas: apanha o elétrico 28, na direção do Martim Moniz, e irás atravessar Alfama rapidamente, a caminho do próximo destino. Aproveita a viagem.
Fim de Tarde
Apanha o elétrico 15, na Praça da Figueira. Vai atravessar a baixa e dirigir-se para fora do centro, na direção de Alcântara. Pede ao condutor para te indicar a paragem mais próxima da LX Factory, um complexo industrial antigo que esteve abandonado durante décadas. Reabriu em 2007 e estabeleceu-se como uma “ilha criativa” de Lisboa.
No Lx Factory, em edifícios onde as paredes estão decoradas com arte urbana, podem encontrar-se lojas, escritórios de arquitetura e design, espaços de coworking, produtores de artes visuais, galerias, cafés, restaurantes, bares e estão espaços novos a abrir constantemente.
Come uma fatia de bolo de chocolate na Landeau e perde a noção do tempo na Ler Devagar, uma livraria incrível revestida de livros do chão ao teto, com a altura de dois andares. São mais de 150.000 livros, novos e usados, num espaço que vale a pena visitar só por si.
Noite
Como vês, não faltam coisas para fazer em Lisboa. Para a noite, sugiro-te duas opções:
- Fica pelo Lx Factory. Janta num dos restaurantes e vê se há alguma festa num dos armazéns.
- Volta de elétrico para o Cais do Sodré. Podes jantar no acolhedor Café Tati, onde a ementa, de inspiração internacional, varia todos os dias. Às quartas-feiras têm concertos de Jazz (aos domingos à tarde também). Para petiscos portugueses e Fado, com decoração minimalista, opta pel’ O Povo.

A Rua Nova do Carvalho, mais conhecida por “Rua Rosa” (quando lá chegares percebes porquê), é tudo o que precisas para o resto da noite. Bebe um cocktail na Pensão Amor, mas sai antes de chegarem as multidões.
Dança ao som dos anos 70, 80 e 90 no Jamaica ou no Tokyo até por volta das 3. Daí segue para oMusicbox para uma boa dose de musica eletrónica (ou vai mais cedo se souberes de algum concerto em particular que queiras ver). Se ainda tiveres energia, no Europa e no Copenhaga os after-hours começam às 6.
Madrugada/Manhã do dia seguinte
Não podes ir para casa sem ensopar o álcool que consumiste. Passa na Casa Cid e come uma bifana, uns rissóis, umas moelas ou mesmo um cozido à Portuguesa.
Sim, o restaurante tem um aspeto manhoso e é possível que tenhas gente com ar estranho a vir-te pedir comida (tem cuidado com a carteira), mas é um clássico. Abriu em 1913, quando servia os marinheiros e prostitutas que deambulavam por estas ruas e é o único lugar onde podes comer destas coisas até às dez da manhã.
Vai dormir.
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